terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Artigos, artigos e mais artigos

Editorial da Revista Dental Press de Ortodontia e Ortopedia Facial, Jorge Faber.


Várias vezes por mês alguém me consulta a respeito de como escrever um artigo científico. São estudantes de pós-graduação, colegas de várias especialidades ou outras áreas. As dúvidas variam, cobrem campos diversos - do relato de caso à metanálise - e raramente se repetem. Nesses momentos, me lembro sempre de um dos maiores nomes da Odontologia do século 20, Robert Gorlin, famoso por ter emprestado seu nome a várias síndromes e sinais clínicos. Ele comentou, em um artigo em que relatava mais uma síndrome que descobrira, a sua dificuldade em escrever um artigo. Escrever o quintucentésimo artigo, dizia ele, foi tão doloroso quanto escrever o primeiro e revisões repetidas eram rotina.
O seu tormento realça que o assunto é complexo e também vasto: há livros inteiros dedicados ao tema. Entretanto, alguns princípios gerais norteiam a prática da boa redação de um artigo.
Um importante fundamento é que a pesquisa seja totalmente delineada antes de serem coletados os primeiros dados, sejam eles variáveis clínicas ou artigos de uma revisão bibliográfica. O investimento em planejamento assegura que não se perderá tempo no transcorrer do trabalho, e permite que o pesquisador estruture suas idéias sobre o tema desde o início, facilitando a redação do artigo.
O segundo ponto é que há uma estrutura para os artigos científicos que precisa ser obedecida - as revistas disponibilizam aos autores instruções a esse respeito. Ela pode ter particularidades em algumas áreas do conhecimento. Os relatos de caso em Ortodontia diferem estruturalmente daqueles na área de Dentística. Entretanto, o modelo de referência para os artigos de pesquisa - comumente denominado IMReD (sigla derivada de Introdução, Material e Métodos, Resultados e Discussão) - é quase universal e foi formulado após décadas de evolução na preparação de artigos. A adesão a esse arquétipo ocasiona a reprodutibilidade da pesquisa e fluidez, além da agradabilibilidade no texto.
A importância deste último ponto, o texto, é muitas vezes subestimada pelos autores. Talvez exista a tendência de acreditar que a qualidade da informação técnica suplanta eventuais deficiências no vernáculo. Entretanto, é inevitável que revisores e editores, ao se depararem com um texto repleto de erros, perguntem a si mesmos: se o autor não teve o cuidado de redigir adequadamente o trabalho, será que ele foi cuidadoso com o ensaio, com a coleta de dados, com a análise estatística? Essa questão sublinha a relevância da cuidadosa revisão da língua que, idealmente, deve ser feita por um profissional da área.
Ao final desses passos, revisões, não re-revisões, ou melhor, re-re-revisões são fundamentais. O último dos quatro preceitos de Descartes sobre os quais se ergueu a ciência moderna foi "fazer em tudo enumerações tão completas e revisões tão gerais que eu tenha certeza de nada omitir". Vários autores de artigos muito citados já me relataram que algo em torno de dez profundas revisões é uma atitude normal.
O cômputo de todo esse conjunto de esforços é gratificante e se justifica.



Artigo na íntegra via Scielo:

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