segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Avaliação clínica de sinais e sintomas da disfunção temporomandibular em crianças


Artigo publicado no ano de 2006 (Maringá, v. 11, n. 2, p. 29-34, mar./abril), na Revista Dental Press de Ortodontia e Ortopedia Facial, pelos autores Eduardo César Almada Santos; Franscisco Antonio Bertoz; Lilian Maria Brisque Pignatta; Flávia de Moraes Arantes, que atuam na Disciplina de Ortodontia Preventiva da Faculdade de Odontologia de Araçatuba/UNESP.

Este trabalho avalia a freqüência dos sinais e sintomas, dos hábitos parafuncionais e das características oclusais de 80 crianças, pacientes da clínica de Ortodontia Preventiva da Faculdade de Odontologia de Araçatuba – UNESP.

          A Disfunção Temporomandibular (DTM) consiste de um conjunto de sinais e sintomas que envolvem os músculos mastigatórios, as ATM e estruturas associadas.
Ela pode ser caracterizada por dores musculares e articulares, limitação e desvio na trajetória mandibular, ruídos articulares durante a abertura e fechamento bucal, dores de cabeça, na nuca e pescoço e dores de ouvido.
Apesar da DTM não apresentar etiologia definida, acredita-se que fatores funcionais, estruturais e psicológicos estejam reunidos, caracterizando multifatoriedade à origem da disfunção da ATM. Algumas condições, como más oclusões, parafunções e estado emocional estão presentes com determinada freqüência em pacientes com sinais de disfunção. Entretanto, não se pode afirmar até que ponto estes fatores são considerados predisponentes ou, apenas, coincidentes.
Devido à possibilidade das disfunções da ATM se originarem no início do crescimento craniofacial, há uma elevada porcentagem de crianças que apresentam sinais e sintomas associados com distúrbios temporomandibulares.
Considerando estudos relevantes em pacientes jovens, destaca-se o de Nilner e Lassing, que determinaram a prevalência de sinais e sintomas de distúrbios funcionais e doenças do sistema estomatognático em 440 crianças de 7 a 14 anos de idade, as quais foram entrevistadas e examinadas clinicamente. A entrevista revelou que 36% apresentavam sintomas, sendo 5% com dores de cabeça recorrentes e 13% relataram estalidos nas ATM. Setenta e sete por cento das crianças apresentaram ao menos uma parafunção oral.
Com o mesmo desiderato, Bernal e Tsamtsouris estudaram os sinais e sintomas de 149 crianças de 3 a 5 anos de idade. Sintomas subjetivos como dores de cabeça, dores de ouvido, cansaço durante a mastigação e rangido dentário foram relatados pelos pais em 38% das crianças.
Recentemente, Thilander et al. analisaram uma amostra de 4.724 crianças, de 5 a 17 anos de idade, agrupadas de acordo com a idade cronológica e o estágio de desenvolvimento dentário. Os registros incluíram a oclusão funcional, os desgastes dentários, a mobilidade mandibular e dor, à palpação, muscular e nas ATM. A dor de cabeça foi o único sintoma da DTM relatado pelas crianças. Os resultados mostraram que um ou mais sinais clínicos foram registrados em 25% dos indivíduos. As prevalências aumentaram durante os estágios de desenvolvimento dentários. Associações significantes foram encontradas entre diferentes sinais e a DTM foi associada com mordida cruzada posterior, mordida aberta anterior, má oclusão Classe III de Angle e trespasse horizontal excessivo.
A partir das considerações supracitadas, objetivou-se, neste estudo, verificar a prevalência de sinais e sintomas da disfunção temporomandibular, dos hábitos parafuncionais e das características oclusais em crianças na fase de dentadura decídua e mista.

MATERIAIS E MÉTODOS 

Foram examinadas 80 crianças, 42 do gênero feminino e 38 do gênero masculino, de 5 a 12 anos de idade, pacientes da Clínica de Ortodontia Preventiva do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia de Araçatuba – UNESP. Os pacientes selecionados apresentavam má oclusão predominantemente dentária, considerando-se a análise facial e a relação sagital dos arcos dentários.
O exame clínico constituiu-se de avaliação das características oclusais do paciente considerando a relação molar, o deslocamento funcional, a existência de mordida cruzada anterior e posterior, mordida topo-a-topo, mordida aberta anterior e mordida profunda. Também observou-se a presença de hábitos parafuncionais: bruxismo, sucção digital e de chupeta, onicofagia, interposição labial e deglutição atípica. Os sinais clínicos da disfunção temporomandibular foram verificados por meio da constatação de ruídos articulares, travamento, luxação, dor durante movimentos mandibulares e a capacidade máxima de abertura bucal. Além desses exames, as crianças foram submetidas a uma entrevista, acompanhadas pelos pais ou responsáveis, cujas perguntas relacionavam-se com os sinais e sintomas da disfunção temporomandibular, como: dificuldade de abertura bucal e movimentação da mandíbula, dor e cansaço muscular durante a mastigação, dores de cabeça, nuca e pescoço, dores de ouvido ou na região das articulações. Foi questionada também a presença de ruídos nas ATM, hábitos de apertar e/ou ranger os dentes e traumas recentes na cabeça, pescoço ou mandíbula (Quadro 1). A avaliação foi realizada por um único examinador.
Todos os dados foram registrados em fichas específicas e individuais, e os resultados submetidos à análise estatística descritiva e distribuídos em gráficos.

RESULTADOS
 
O protocolo para a avaliação dos pacientes foi elaborado seguindo o sistema de avaliação de alguns autores e as características mais significantes foram escolhidas e dispostas em gráficos, enumerados de 1 a 5.


 


 O gráfico 1 refere-se à freqüência de sinais e sintomas da disfunção temporomandibular, no qual pode-se observar que os sinais e sintomas mais freqüentes foram os hábitos de apertar ou ranger os dentes (35%), dores de cabeça (22,5%), ruídos nas ATM (18,7%) e dores de ouvido ou na região das ATM (13,7%). Outras características menos encontradas foram: dor na nuca ou torcicolo (8,7%), trauma na cabeça, pescoço ou mandíbula (6,2%), dificuldade para movimentar a mandíbula para os lados (3,7%) e dificuldade ou dor ao abrir a boca (1,2%).
Analisando-se o gráfico 2, observa-se que ao exame clínico, as características oclusais mais freqüentes foram: mordida aberta anterior (56,2%) e mordida cruzada posterior (38,7%), seguidas de mordida cruzada anterior dentária (7,5%), mordida profunda (6,2%) e mordida topo a topo (2,5%). Ao verificar a relação sagital, 62,5% apresentavam Classe I e 37,5% Classe II, segundo a Classificação de Angle (Gráf. 3).
Os hábitos parafuncionais são observados no gráfico 4, onde a onicofagia e o bruxismo foram os hábitos mais prevalentes, com 47,5% e 35%, respectivamente. Sucção de chupeta (28,7%), sucção digital (21,2%), deglutição atípica (18,7%) e interposição labial (5%) foram outros hábitos também encontrados.
O estalido na ATM observado no gráfico 5, apresenta uma freqüência de 8,7%. Os demais sinais da DTM analisados durante o exame clínico, como a presença de crepitação, travamento e luxação nas ATM e capacidade máxima de abertura bucal menor que dois dedos da criança não foram encontrados em nenhum paciente.

DISCUSSÃO 

O presente estudo teve o objetivo de demonstrar a prevalência de sinais e sintomas da disfunção temporomandibular em crianças na fase de dentadura decídua e mista.
Devido à dificuldade de se trabalhar com uma população jovem, de 5 a 12 anos de idade, e à complexidade deste tipo de exame, procuramos utilizar um método simples e objetivo, baseado em publicações científicas, que proporcionasse os dados referentes à disfunção por meio de exame clínico e entrevista de fácil aplicação pelo examinador e compreensão dos pacientes. A participação dos pais ou responsáveis é importante durante a entrevista, pois crianças não têm maturidade para relatar com precisão os sinais e sintomas. Não foi incluída nesta avaliação a palpação dos músculos temporal, masseter, pterigóideo lateral e medial, realizada por alguns autores, por ser um exame complexo, de difícil execução e que, de acordo com Bernal e Tsamtsouris, devido à idade precoce dos indivíduos, possibilitaria a má interpretação de seu significado subjetivo e percepção da dor.
Os resultados obtidos não confirmam os resultados encontrados por Bernal, Tsamtsouris; Nilner e Lassing, pois a amostra utilizada foi previamente selecionada para tratamento ortodôntico. Todos os indivíduos possuíam má oclusão predominantemente dentária, de acordo com a análise facial e relações oclusais sagitais.
Quando avaliados no sentido sagital, 62,5% dos pacientes possuíam má oclusão Classe I, segundo a Classificação de Angle, enquanto 37,5% eram Classe II. Um único paciente possuía má oclusão Classe III, o qual foi excluído da amostra por não preencher os requisitos para tratamento em clínica de Ortodontia Preventiva do curso de graduação. Bernal e Tsamtsouris encontraram em sua amostra 83% dos indivíduos Classe I, 8% Classe II e 1% Classe III, e Nilner e Lassing 84% Classe I, 14% Classe II e 2% Classe III.
A freqüência de mordida aberta anterior, mordida cruzada posterior e mordida cruzada anterior foi maior quando comparada com os achados de Nilner, Lassing; Bernal e Tsamtsouris. Egermark- Eriksson et al. e Thilander et al. afirmaram que mordida cruzada posterior, mordida aberta anterior e más oclusões Classe II e Classe III de Angle têm influência no desenvolvimento da DTM.
O hábito de apertar ou ranger os dentes, conhecido como bruxismo, foi o sinal mais encontrado (35%), sendo associado com a maioria dos sintomas dolorosos da DTM, juntamente com os hábitos de sucção digital e onicofagia, que em nosso estudo foram também muito freqüentes, com 21,2% e 47,5%, respectivamente. Vanderas afirma que os hábitos parafuncionais podem ser causas "suficientes" para o desenvolvimento da disfunção temporomandibular.
A dor de cabeça foi o sintoma mais freqüente, com 22,5%, aproximando-se do resultado encontrado por Bernal e Tsamtsouris, que obtiveram um percentual de 22%, e 19% de Nilner e Lassing, porém superior aos 11,4% obtidos por Thilander et al. Estes decréscimos nas porcentagens podem ser justificados pelo fato destes autores terem pesquisado crianças em faixas etárias mais elevadas. As crianças mais novas são mais cooperativas e podem responder às perguntas com falsa afirmativa.
O estalido durante o movimento da ATM foi observado em 8,7% dos pacientes estudados, valor semelhante ao encontrado por Nilner e Lassing (8%), mas inferior aos resultados de Almeida, Silva e Cardoso et al., que obtiveram 25%, e 18,13% de Sönmez et al., com crianças na dentadura mista. Thilander et al. associam o estalido com o deslocamento da mandíbula, sensibilidade muscular, capacidade de abertura bucal reduzida e interferências, contudo neste estudo tais sinais e sintomas não foram observados.

CONCLUSÃO 

Concluímos que os sinais e sintomas mais freqüentes foram o hábito de ranger os dentes, dores de cabeça e ruídos na ATM. A onicofagia e o bruxismo foram os hábitos parafuncionais mais prevalentes. Diante disto, torna-se aconselhável que a avaliação de sinais e sintomas da disfunção da ATM em crianças seja adotada como rotina durante o exame clínico inicial.
Ressaltamos que a freqüência de sinais e sintomas da Disfunção Temporomandibular pode ser verificada em crianças por meio da entrevista e exame clínico minucioso. 


Artigo na íntegra via Scielo:

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