domingo, 21 de novembro de 2010

Termo do 1º Consenso em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial



        
Artigo publicado na Dental Press Journal of Orthodontics, em 2010, por Simone Vieira Carrara, Paulo César Rodrigues Conti, Juliana Stuginski Barbosa.

O Termo do 1º Consenso em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial foi criado com o propósito de substituir divergências por evidência científica dentro dessa especialidade da Odontologia. O documento oferece informações claras e fundamentadas para orientar o cirurgião-dentista e demais profissionais de saúde sobre os cuidados demandados pelo paciente, tanto no processo de diagnóstico diferencial quanto na fase de aplicação das terapias de controle da dor e disfunção. O Termo foi aprovado no mês de janeiro de 2010 em reunião realizada durante o Congresso Internacional de Odontologia do Estado de São Paulo e converge o pensamento dos profissionais mais conceituados do Brasil na especialidade Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial.

Por definição, dor orofacial é toda a dor associada a tecidos moles e mineralizados (pele, vasos sanguíneos, ossos, dentes, glândulas ou músculos) da cavidade oral e da face. Usualmente, essa dor pode ser referida na região da cabeça e/ou pescoço ou mesmo estar associada a cervicalgias, cefaleias primárias e doenças reumáticas como fibromialgia e artrite reumatóide.
As principais fontes de dor orofacial são problemas odontogênicos, cefaleias, patologias neurogênicas, dores musculoesqueléticas, dores psicogênicas, câncer, infecções, fenômenos autoimunes e trauma tecidual1.

DEFINIÇÃO DE DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR (DTM)

Segundo a Academia Americana de Dor Orofacial, a DTM é definida como um conjunto de distúrbios que envolvem os músculos mastigatórios, a articulação temporomandibular (ATM) e estruturas associadas.
Os sintomas mais frequentemente relatados pelos pacientes são: dores na face, ATM e/ou músculos mastigatórios, dores na cabeça e na orelha. Outros sintomas relatados pelos pacientes são as manifestações otológicas como zumbido, plenitude auricular e vertigem.
Quanto aos sinais, encontram-se primariamente a sensibilidade muscular e da ATM à palpação, limitação e/ou incoordenação de movimentos mandibulares e ruídos articulares.

EPIDEMIOLOGIA

Estudos epidemiológicos estimam que 40% a 75% da população apresentem ao menos um sinal de DTM, como ruídos na ATM e 33%, pelo menos um sintoma, como dor na face ou na ATM.
Um estudo recente concluiu que 37,5% da população apresentavam ao menos um sintoma de DTM. Entre estudantes universitários, estima-se que 41,3% a 68,6% apresentem algum sinal ou sintoma de DTM.
Existe uma diferença entre a prevalência de sinais e sintomas de DTM na população e a necessidade de tratamento desses indivíduos. Em uma revisão
sistemática com metanálise publicada recentemente,a prevalência de necessidade de tratamento para DTM na população adulta foi estimada em 15,6%, sendo que as estimativas para a população jovem, de 19 a 45 anos, foi maior do que para a de adultos mais velhos (acima de 46 anos).

DIAGNÓSTICO

Ainda não há método confiável de diagnóstico e mensuração da presença e severidade das disfunções temporomandibulares que possa ser usado de maneira irrestrita por pesquisadores e clínicos. Para o diagnóstico de casos individuais, a anamnese continua sendo o passo mais importante na formulação da impressão diagnóstica inicial.
O exame físico, constituído por palpação muscular e da ATM, mensuração da movimentação mandibular ativa e análise de ruídos articulares, quando executado por profissionais treinados e calibrados, é instrumento de grande validade no diagnóstico e na formulação de propostas de terapia, assim como de acompanhamento da eficácia dos tratamentos propostos.
O uso de modalidades auxiliares de diagnóstico, como a polissonografia e imagens da ATM, é considerado um meio auxiliar, tendo utilidade somente em alguns casos individuais e em trabalhos de pesquisa..
No questionário de avaliação inicial da clínica odontológica, é importante a inclusão de algumas perguntas ligadas aos sinais e sintomas de DTM. A resposta positiva a uma dessas questões pode sinalizar a necessidade de avaliação completa por profissional especializado em DTM e Dor Orofacial (Quadro 1).

ETIOLOGIA

A tentativa de isolar uma causa nítida e universal da DTM não tem sido bem-sucedida. Estudos recentes concluem que a DTM tem origem multifatorial.
Faz parte de uma anamnese completa a identificação de fatores predisponentes (que aumentam o risco da DTM), fatores iniciadores (que causam a instalação das DTMs) e fatores perpetuantes (que interferem no controle da patologia). Dentre esses fatores citaremos aqueles que supostamente são mais relevantes

Trauma
• Trauma direto ou macrotrauma.
• Trauma indireto: representado por lesões do
tipo chicote.
• Microtrauma: provocado por traumas de pequena
monta, realizados de maneira repetitiva,
como hábitos parafuncionais (bruxismo, apertamento
dentário, etc).

Fatores psicossociais
• Ansiedade, depressão, etc.

Fatores fisiopatológicos
• Fatores sistêmicos: doenças degenerativas, endócrinas,
infecciosas, metabólicas, neoplásicas, neurológicas,
vasculares e reumatológicas.
• Fatores locais: alteração na viscosidade do líquido
sinovial, aumento da pressão intra-articular,
estresse oxidativo, etc.
• Fatores genéticos: presença de haplótipos associados
à sensibilidade dolorosa.
É consenso entre pesquisadores e clínicos especializados em dor orofacial que a oclusão dentária não mais pode ser considerada fator primário na etiologia da DTM. Alguns fatores de relacionamento oclusal são citados como predisponentes das DTM, entretanto, estudos demonstram que a correção desses fatores em indivíduos sintomáticos tem pouca eficácia no controle da DTM.

TRATAMENTO

Os avanços científicos nessa área de conhecimento exigem dos profissionais constante atualização. Terapias inadequadas podem gerar iatrogenias, permitir a cronificação da dor, além de induzir o paciente a acreditar, equivocadamente, que sua patologia deveria ser tratada por profissional de outra especialidade.
O objetivo do tratamento da DTM é controlar a dor, recuperar a função do aparelho mastigatório, reeducar o paciente e amenizar cargas adversas que perpetuam o problema.
A etiologia indefinida, o caráter autolimitante e a altíssima eficácia recomendam a utilização inicial de terapias não-invasivas e reversíveis para os pacientes que sofrem de DTM.
Alguns estudos relatam o controle de sinais e sintomas em mais de 90% dos pacientes que receberam tratamentos preservadores. Educação do paciente, automanejo, intervenção comportamental, utilização de fármacos, placas interoclusais, terapias físicas, treinamento postural e exercícios compõem a lista de opções aplicáveis a quase todos os casos de DTM.
A prática da Odontologia Baseada em Evidência(OBE) não ampara a prescrição de técnicas que promovem mudanças oclusais complexas e irreversíveis, como o ajuste oclusal por desgaste seletivo, terapia ortodôntica, ortopedia funcional, cirurgia ortognática ou técnicas de reabilitação oral protética no tratamento da disfunção temporomandibular.
Com relação às cirurgias de ATM, é possível afirmar que são necessárias em alguns poucos casos específicos, tais como anquilose, fraturas e determinados distúrbios congênitos ou de desenvolvimento.  Excepcionalmente são aplicáveis para complementar o tratamento em transtornos internos da ATM.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A especialidade DTM e Dor Orofacial foi criada em 2002 pelo Conselho Federal de Odontologia. A despeito disso, mesmo entre profissionais da saúde, essa especialidade ainda é pouco conhecida. A adoção da disciplina de DTM e Dor Orofacial na grade curricular dos cursos de graduação de Odontologia é indispensável e urgente. O reconhecimento e o apoio, por parte das autoridades que gerenciam a política de saúde pública, são necessários para que o atendimento primário ao paciente com dor orofacial seja viabilizado de forma eficaz. Essas medidas reduzirão o sofrimento desses indivíduos e a sobrecarga financeira sobre eles.
Deve ser considerada postura antiacadêmica estabelecer protocolo ou promover cursos de Educação Continuada apoiados na terapia oclusal como forma de terapia definitiva para o controle de sinais e sintomas de DTM.
As pesquisas sobre a dor orofacial contribuíram para aprimorar os tratamentos propostos, porém é indispensável que novos estudos elucidem questões relevantes e que as outras especialidades da Odontologia absorvam e apoiem essas novas conquistas.

Artigo na íntegra via Scielo:



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